A constatação do carácter predatório da construção em relação ao território, aventura do acaso, oferece um panorama de conjunto traçado no descontrolo ambiental e no caos urbanístico, em grande parte causado por um desenvolvimento imobiliário apressado e por falta de instrumentos de previsão. Ainda assim, este descontrolo abriu espaço para alguns aspectos positivos, essencialmente evidentes no progresso social e económico paradoxalmente subjacentes a estes desequilíbrios e à desqualificação da ocupação do meio ambiente.
Perante o cenário de catástrofe a reacção pública tende a ser fragmentadora, recusando o novo e concedendo a priori que qualquer tecido antigo e consolidado seja "belíssimo" e que qualquer projecto contemporâneo seja "horrível". A defesa e a preocupação em torno dos centros históricos, por exemplo, configuraram-se como uma espécie de hipocrisia: como se nos centros tradicionais existisse uma grande qualidade que a arquitectura contemporânea destrói, enquanto que "o resto" é considerado um mundo à parte onde se pode construir com leviandade.
André Tavares, António Madureira, João Soares e Maddalena d'Alfonso. Arquitectura em Portugal, um roteiro fotográfico. São Paulo, 2003.
quinta-feira, fevereiro 27, 2014
O suporte mínimo dessa edificação
A Rua da Estrada é um dos elementos mais legíveis da estruturação da urbanização excessiva. Num país histórica e profundamente deficitário em infra-estruturação, que só teve auto-estradas na década de noventa, era de esperar que a dinâmica de crescimento do pós-guerra tivesse que produzir edificação algures. As estradas e o que nelas havia (electricidade e telefone, quando calhava) eram o suporte mínimo dessa edificação com acesso garantido. É isso que explica, e não os bodes expiatórios do costume: especulação, défice de planeamento (no Antigo Regime, havia só uns planos para uns bocados de cidades e pouco mais), ilegalidade (ou a-legalidade?). Compactar isto na conversa do "feísmo" torna a realidade mais opaca e indiscernível.
Álvaro Domingues. A Rua da Estrada. Dafne, 2009.
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