domingo, junho 10, 2012

Nesta cidade

Vejo os taxistas de manhã a limpar os seus carros: uma zelo contrariado, bruto, estofos demasiado brilhantes para a elegância e para sempre um infinito banco de trás onde me permito não usar cinto. Os táxis são os únicos carros onde não uso cinto: abro o vidro e deixo-me deslizar naqueles bancos pretos (imagino sempre os táxis com bancos pretos, nunca reparo de que cor são na realidade). Quando o carro curva, deixo-me levar um pouco e imagino o que aconteceria se me deixasse rebolar e para lá da porta do lado esquerdo houvesse um outro mundo onde os táxis não precisassem de cintos. No outro dia um taxista queixa-se de que já tinha sido condutor de pesados, já não tinha costas para isso, já não havia mãos para isso, algo sobre perda e eu emocionei-me com a noção de escala de um homem que parecia entender a minha necessidade de seguir sem cinto. Olhou, viu a janela aberta e calou-se. Julgo que seguimos os dois emocionados, que ele percebeu que embora não o estivesse a ouvir o tinha percebido o suficiente para dele me recordar e ficámos por ai.

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