sexta-feira, setembro 16, 2005

Mudar de lençois

"[...]
Lembro-me de quando estacionaste na rotunda e me ligaste:

“Estou perdido. Vem-me buscar”.

Lembro-me de me ter rido e de ter brincado contigo, acusando-te de te perderes dentro de casa. Lembro-me de ter calçado os meus mocassins creme, de ter corrido para o espelho da casa de banho, já de chaves da porta na mão, para ver como estava o meu cabelo. Lembro-me de ter batido a porta e corrido, corrido, corrido, como raramente o faço, para ti, para te ir buscar, longe ou perto, onde quer que estivesses.
Lembro-me de entrar no carro, com a cara gelada, e de me teres puxado contra ti e beijado, gracejando sobre a pouca fiabilidade das indicações que te dera, para chegares até mim, à revelia de todos.
Passo hoje pela rotunda e só me recordo. O lugar onde paraste está vazio, à espera de outro alguém, que espere ser buscado, por outra pessoa, que também corra como eu corri, que também ache que o amor vale qualquer corrida, que ajeite o cabelo e sinta o vento gelado acreditando, quanto mais não seja naquele momento, que para ser feliz, basta que alguém esteja, em algum lugar, à nossa espera.
[...]"


Rute Frazão

Uma vénia às nobres almas que ao longo dos tempos foram construindo uma certa cama. Porque em tempos - vamos chamar-lhe a minha "adolescência wébica" - me fizeram perceber que na internet (afinal) não havia só pornografia, mp3 e chats. Porque eu também vivo junto a uma grande rotunda onde um certo alguém se pode perder. Porque os lugares comuns nem sempre são vulgares.

(Ou então) Porque ando com a cabeça em (alegre e desejada) desfragmentação e isso de escrever coisas originais dá trabalho.

3 comentários:

Sergio Figueiredo disse...

Para poucos esses lugares e essas situações. Também há quem os prefira esquecer.

(e viver em S.João da Madeira é logo meio caminho andado para se viver perto de uma rotunda)

Anónimo disse...

havera sempre uma rotunda...o importante na vida é saberes definir qual a rotunda certa para onde conduzir o teu coraçao!

Sergio Figueiredo disse...

Isso é muito bonito, e frequentemente utópico...