segunda-feira, junho 10, 2013

Não é manso nem meigo, não é mau nem ilegal

Um poema não é uma coisa que se coloca sobre o teu dia como um condimento sobre o teu almoço. A vida de uma pessoa não tem material semelhante a nada que conheças. Existir é feito de peças impossíveis de copiar. E a poesia não entra nesse material único - a vida de uma pessoa - como o avião no ar ou o acidente do avião na terra dura. Um poema não é manso nem meigo, não é mau nem ilegal.


Os homens não se medem pelos poemas que leram, mas talvez fosse melhor. O que é a fita métrica comparada com algo intenso? Há poemas que explicam trinta graus de uma vida e poemas que são um ofício de demolição completa: o edifício é trocado por outro, como se um edifício fosse uma camisa. Muda de vida ou, claro, muda de poema. 

Gonçalo M. Tavares, A perna esquerda de Paris (Relógio D'Água, 2004).

1 comentário:

a ortónima disse...

o m.tavares e a sua forma crua de dizer as coisas, tão concretas e, ao mesmo tempo, tão densas. como se descrevesse realidades e visões que sempre nos acompanharam mas só agora, depois de ele as escrever, as percebemos.