quinta-feira, fevereiro 01, 2007

Um dia gostava de crescer isto

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Eu não sei escolher palavras. Existem algumas que me escorrem pela cabeça, mas a maioria delas têm tendência a fugir. É uma coisa triste, porque eu escrevia tantas coisas – se pudesse. Talvez a imaginação seja subvalorizada, porque eu tenho muita inveja daqueles tipos que parecem ter sempre alguma coisa inteligente a dizer. Eu normalmente fico calado – não é ignorância, é falta de imaginação.

Nunca conheci nenhum poeta. Todos os meus amigos são tipos pouco faladores, com quem é estranho ter uma conversa, porque tendem a repetir aquilo que lhes dizemos. É como falar com um espelho que berra. Muito estranho. Quando vamos a bares, as pessoas olham de lado: nenhum de nós bebe, mas parecemos sempre os mais agitados. O que é esquisito, para tipos pouco faladores – mas quando cinco gajos começam a repetir cada vez mais alto as mesmas frases, há pessoas que rebolam os olhos.
Vamos sempre embora cedo, para casa de um deles que vive num prédio velho com um terraço partilhado com todo o condomínio: as velhas põem lá a roupa a secar, nós fumamos. Eu não fumo, só ponho o fumo na boca e deixo sair de novo – é o suficiente para deixar a roupa das velhas a cheirar a fumo e, no fundo, é só a isso que achamos piada.

De todos, sou provavelmente o mais aplicado nos estudos. Isto quer dizer que passo pela faculdade várias vezes por semana e costumo saber quando vamos ter exames. Gosto do curso, mas não lhes digo porque tenho a impressão que isso os ia fazer rir - costumam dizer que sou o último dos matemáticos encantados, que ainda acredito na salvação do mundo pela ordem das coisas.

2

Quando era miúdo, fui uma vez com a escola ao planetário. Era uma espécie de cinema de aldeia, pequeno e deprimente, mas com as cadeiras inclinadas de mais. Projectaram no tecto as constelações e as galáxias e todas essas outras coisas que ninguém percebe muito bem – e eu gostei. Não porque quisesse ser astronauta: achei piada à sensação de movimento, semicerrei os olhos e fingi que estava a voar de verdade, a fugir da cadeira.
Há noite, em casa, tentei encontrar uma das ursas com a ajuda do panfleto que tinham oferecido. Não a encontrei e não senti a minha cabeça rodar. Acho que foi ai que percebi que às vezes as ilusões são uma coisa muito boa.

5 comentários:

R.Noga disse...

olha que já é grande!

Anónimo disse...

a imaginação ou a curiosidade são uma coisa muito mais milaborante do que qualquer palavra escrita..Também tenho um terraço no cimo do meu prédio..tenho de passar por uma janela para poder ir para lá..o cenário é enfadonho..mas o céu está tão perto..
ás vezes os pirilampos atordoam-me até quase adormecer com os dedos dos pés gelados..

Anónimo disse...

temos de ir tomar uns cafés! =p

Anónimo disse...

Fiquei com vontade de dividir uma foto. Não tão bonita quanto as suas..Uma que saiu sem pretensão.

Tiago Costa disse...

A pretensão nesta coisa de fingir que se é artista, pode ser útil. Divida. :)